JUSTIÇA - O QUE É FAZER A COISA CERTA (RESUMO - CAP.8)
JUSTIÇA
O QUE É FAZER A COISA CERTA
Capítulo 8 – Quem merece o quê
? / Aristóteles
O
livro Justiça é um best-seller com mais de cem mil cópias vendidas
no Brasil, algo realmente espantoso, considerando tratar-se de uma
obra filosófica sobre ética. O Autor, professor da Universidade de
Harvad, Michael J. Sandel, ocupa lugar de destaque mundial entre os
mais célebres discentes desta área do saber. Conforme consta na
contracapa da obra, ela é baseada no curso “Justice”, iniciativa
onde são abordados os mais profundos problemas cotidianos sob o
ponto de vista da filosofia. É um dos mais populares cursos em
Havard, contando com a aglomeração de quase mil alunos num
anfiteatro. Então, esta introdução evidencia a posição de
destaque que a obra e o seu autor ocupam no cenário acadêmico
filosófico, mas não só nele, alcançando, com sua linguagem
acessível, sem deixar de ser erudita, milhares de leitores.
Com
foco na objetividade e síntese, este resumo-resenha abordará apenas
o capítulo oito da obra (Quem merece o quê ? / Aristóteles),
todavia, antes de adentrar naquele trecho, importa contextualizá-lo
com uma breve passagem pelo primeiro capítulo do livro. Neste
sentido, a partir do título do livro, parece claro que o seu
objetivo é tratar sobre o conceito de justiça. Com esse viés, o
autor parte da premissa de que a resposta está na investigação de
como dada sociedade trata a alocação dos bens; ou seja, “para
saber se uma sociedade é justa, basta perguntar como ela distribuí
as coisas que valoriza – renda, riqueza, deveres e direitos,
poderes e oportunidades, cargos e honrarias (pág. 28).
Então, num primeiro momento, o autor
aborda o problema considerando a busca pelo bem-estar, sobre a
promoção da prosperidade e da felicidade. Depois, trata sobre as
teorias que associam a justiça à liberdade, sobretudo, como
garantia dos direitos individuais. Por fim, Sandel estuda as
concepções de justiça que se conectam com os conceitos de virtude
e vida boa, sendo aqui onde se insere o capítulo oito, objeto deste
texto.
A partir desta última concepção de
justiça, o capítulo oito, baseado no pensamento do filósofo grego
Aristóteles (384-322 a.C.), inicia, como é rotineiro no livro, com
um exemplo concreto: uma estudante do ensino médio, portadora de
paralisia cerebral e cadeirante, que se destacava pelo entusiasmo em
participar da torcida organizada da sua escola. Relata que num
determinado momento, a diretoria informou àquela aluna que se ela
desejasse continuar na equipe de torcedoras deveria, como as demais,
se submeter aos rigorosos exercícios físicos preparatórios.
Portanto, a história suscita o problema da equidade. Todas as alunas
daquele grupo deveriam ser tratadas de forma isonômica? Mas, seria
injusto exigir da deficiente o mesmo tratamento que era exigido das
demais?
A
primeira possibilidade de resposta estaria na consideração de que a
aluna, em que pese seu problema físico, desempenhava bem a sua
função e se isso não seria motivo suficiente para dispensá-la
tratamento diferente. Então, o foco estaria em verificar quais
seriam as qualidades (virtudes) necessárias para alcançar a
finalidade (télos)
do grupo. Ai estão as duas concepções centrais da filosofia
política aristotélica. É dizer, “para definir os direitos, é
preciso saber qual é o télos
(palavra grega que significa propósito, finalidade ou objetivo) da
prática social em questão” (pág. 233). Por sua vez, discutir a
finalidade da conduta, significa correlacionar o problema com as
virtudes que devem ser destacadas ou premiadas.
Aristóteles
acredita que a noção de justiça está atrelada com os conceitos de
honra, virtude e vida boa. Com este modo de pensar, o filósofo
estagirita defende que o tratamento igualitário é aquele que
distribuí segundo as virtudes de cada um. Portanto, por exemplo,
“imaginemos que estejamos distribuindo flautas. Quem deve ficar com
as melhores? A reposta de Aristóteles: os melhores flautistas”
(pág. 234). Assim, de certa forma, a justiça aristotélica é
meritória, dando ênfase e recompensando os atributos inerentes de
cada um, por exemplo, tocar bem a flauta. Esta forma de pensar sobre
a justiça está coerente com a realidade daquela época, quando a
ética estava associada à política. Então, fica claro que o justo
está para o bem comum da pólis,
pois o investimento nos melhores flautistas resultaria, em última
análise, no deleite de toda a sociedade.
O
autor avança, com a pergunta sobre “qual o télos
de uma universidade?” (pág. 237). Questão que, evidentemente,
admite uma variada possibilidade de respostas. Portanto, no mesmo
sentido, toda decisão ética corresponde a uma discriminação,
sempre com o objetivo de potencializar as virtudes e as capacidades
individuais dos cidadãos. Assim fazendo, seguindo o curso natural
das finalidades, a pólis
alcançaria a vida boa, onde “a felicidade não é mero estado de
espírito, mas uma maneira de ser, uma atividade da alma em sintonia
com a virtude” (pág. 244). Então, para o pensador grego, a ética
não é apenas uma questão de seguir regras, mas uma forma de vida,
baseada no exercício das virtudes, formando hábitos. É pela
prática do hábito que o indivíduo alcança a sabedoria necessária
para agir face às novas situações da vida.
Justiça,
diria Aristóteles, é uma questão de adequação, buscando colocar
cada um, segundo suas virtudes, em suas respectivas posições pré
definidas pela natureza ordenada do cosmos. É dizer que “dar aos
indivíduos seus direitos significa dar-lhes ofícios e honrarias que
merecem e os papéis na sociedade que se adequem a sua natureza”
(pág. 248). Sendo assim, claro que, nesta forma de ver a justiça,
nem todos estariam incluídos, por exemplo, no conceito de cidadão,
com pleno acesso e participação nas decisões da cidade. Mulheres e
escravos eram inelegíveis, pois suas características naturais não
lhes faziam adequados para a cidadania. Em outras palavras, tudo é
uma questão de finalidade e virtude. A escravidão correspondia
àqueles considerados menos virtuosos, destinados às tarefas
domésticas; permitindo que os mais virtuosos se ocupassem das
deliberações sobre o bem comum da pólis.
Por
fim, embora as considerações aristotélicas tenham um viés de
discriminação, em geral não é admitido na maioria dos sistemas
éticos contemporâneos, não há como negar que “talvez não seja
possível determinar o que é justo sem discutir a natureza da vida
boa” (pág. 255), a partir de um olhar nas virtudes de cada um.
Referência:
SANDEL,
Michael J. Justiça:
O que é fazer a coisa certa. Rio de Janeiro: Editora Civilização
Brasileira, 2009. 349 páginas.
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